Karl
Heinrich Marx nasceu em Tréveris, província alemã do Reno, em 1818. Ingressou
na Universidade de Berlim em 1836 para estudar Direito. Na década de 40, surgem
obras cruciais para o pensamento de Marx, como “O que é a propriedade”, de
Proudhon; “A essência do cristianismo”, de Feuerbach e, por fim, é publicada a
obra de Engels “Esboço de uma crítica da economia política”. Estas leituras
geram, como fruto, a obra “A miséria da Filosofia”, de 1847.
Após
conhecer o trabalho de Engels e fortalecer com ele os laços de amizade, Marx
vai escrever ao seu lado a obra “Manifesto do Partido Comunista”, texto em estilo
panfletário que lança as bases teóricas e filosóficas do comunismo, uma
doutrina política baseada no socialismo utópico francês, na filosofia da
história de Hegel e nos clássicos da economia política inglesa. Em suas
singelas vinte três páginas, tornou-se a obra mais influente das revoluções dos
séculos XIX e XX. O que faz parecer que o conhecimento de Marx fosse mesmo maior
que sua própria barba.
Embora
tivesse formação jurídica, Marx dedicou-se aos estudos de filosofia e economia
política, participando ativamente de reuniões sindicais e ajudando na formação
do Partido Operário Social-Democrata da Alemanha, a partir da iniciativa de
Wilhelm Liebknecht e August Bebel, não obstante seus inúmeros compromissos com
organizações políticas francesas. Morre em 14 de março de 1883.
Segundo
o escritor Eduardo Galeano, o enterro de Marx contou com uma multidão de onze
pessoas, incluindo o coveiro. Sua frase mais famosa, que parte de uma das Teses
a Feuerbach, tornou-se seu epitáfio: “Os filósofos tem interpretado o mundo de
várias maneiras; mas a questão é transformá-lo”. Apesar de sua grandiosidade
política e intelectual, Galeano conta que o pensador foi perseguido pela
polícia durante toda a vida. E, sobre sua obra-prima de economia e filosofia,
chamada “O Capital”, um estudo ampliado do sistema de produção que até hoje
carrega o nome dado pelo alemão, escreveu: “Ninguém escreveu tanto sobre
dinheiro tendo tão pouco dinheiro. O Capital não vai me pagar nem os cigarros
que fumei escrevendo.”
Em
sua obra “Contribuição à crítica da economia política”, em resposta ao
companheiro intelectual e político Engels, Marx lança algumas bases da
metodologia de análise da história e das relações de produção que marcam as
organizações sociais: o materialismo histórico-dialético. Trata-se de um
conjunto de inversões na análise da propriedade, do trabalho, da produção, da distribuição
e do consumo, numa polêmica incessante com autores como David Ricardo, Adam
Smith, John Stuart Mill e Jean Jacques Rousseau.
Logo
de início, afirma que a “anatomia da sociedade burguesa deve ser procurada na
Economia Política” (p. 47) e, contrariando alguns preceitos da obra de Hegel
“Filosofia do Direito”, pontua o que vem a ser a perspectiva metodológica do
materialismo, dizendo que as relações jurídicas e as formas do Estado não podem
ser explicadas por si mesmas, nem por aquilo que Hegel chamou de “evolução
geral do espírito humano”. Estas relações encontram suas raízes nas condições
materiais de existência (p. 47).
Em
outras palavras, Marx quer dizer que os homens entram em relações determinadas
e necessárias, independentemente de sua vontade, para que só assim possam
produzir socialmente sua própria existência (47). A relação de produção nada
mais é do que o desenvolvimento das forças produtivas materiais de um ser
humano. E assim, a totalidade destas relações constitui a estrutura econômica
da sociedade, sua base real, sobre a qual se sustentam as superestruturas
jurídica e política. O que significa dizer que, para Marx, as relações de
produção, sendo a base material da sociedade, são sua infra-estrutura.
Diz
Marx: “O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida
social, política e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina o
seu ser; é o seu ser social que determina sua consciência.” 47 Aqui está talvez
a inversão fundamental do materialismo: a realidade concreta do ser humano enquanto
ser social é que determinaria sua consciência, e não o inverso.
Mas
o que seria a dialética, em seu método? A dialética viabiliza-se a partir da
negação, da contradição existente em um determinado estado de coisas. Afinal,
em uma certa etapa do desenvolvimento de uma sociedade, as forças produtivas
materiais dos indivíduos entram em contradição com as relações de produção
existentes. Para Marx, então, uma modificação na infraestrutura das condições
econômicas de produção do ser social levaria às transformações das
superestruturas: as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou
filosóficas, que Marx chama de formas ideológicas, formas sob as quais os
humanos adquirem consciência deste conflito e o levam adiante até seu próprio
fim.
No
texto introdutório de sua Contribuição à crítica da economia política, Marx
afirma que o engano dos pensadores da economia política burguesa (como Ricardo,
Smith, Mill e Locke) foi afirmar que seu paradigma central e fundamental seria
a propriedade, nos contornos de propriedade privada individual. Para esta
afirmação, Marx apresenta duas respostas: 1) a história comprova que as
civilizações mais antigas, como os índios, sobretudo na produção cooperativa do
Peru, os povos celtas e eslavos, possuíam a propriedade comum da terra; 2) o
paradigma central da economia política deve ser a ideia de produção, e não
propriedade.
Mas
Marx vai além e explica que os economistas políticos, no entanto, se enganaram
quanto ao conceito de produção. Para eles, a cadeia produtiva seria desenrolada
em produção, distribuição, troca e consumo, como partes de uma unidade
apartadas entre si. Segundo estes economistas, a produção seria determinada por
leis naturais gerais; a distribuição seria determinada pela contingência
social; a troca estaria situada entre estas duas como movimento social formal,
e o ato final de consumo seria colocado como fim e finalidade deste processo,
fora mesmo da economia.(p. 245)
Aqui
o alemão realiza outra inversão fundamental. Marx diz que toda produção é uma
forma de consumo, e, neste sentido, todo consumo se torna uma forma de
produção. Em realidade, tanto a distribuição, como a troca e o consumo são
momentos distintos da produção, numa unidade totalizada. Ocorre, porém, que as
relações de produção vão determinar as formas de distribuição, troca e consumo
no seio de uma dada sociedade. E, como são partes de uma unidade, a própria
maneira de se distribuir e consumir os bens de produção vai, em retorno,
determinar as condições de produção, realimentando o processo da economia
política.
Assim,
se as relações jurídicas e todas as formas ideológicas são constituídas pela
produção, a sustentação destas mesmas formas ideológicas vai ajudar a manter ou
reconstituir as mesmas relações de produção que a geraram. Mas este processo
cíclico possui um fim, porque tende inexoravelmente a consumir a si mesmo, no
momento em que as relações de produção entrarem em contradição com as forças
produtivas dos indivíduos. Afinal, como sabemos, o processo capitalista opera
mediante a espoliação da força de trabalho dos humanos. Por espoliação devemos
entender uma subtração: as forças produtivas dos humanos que não possuem bens
de produção, e que portanto devem vender sua força de trabalho no mercado
capitalista, são vendidas por um baixo custo, gerando a mais-valia. Esta
mais-valia é aquela que se transmuta em lucro e vai para o bolso daquele que
detém os meios de produção. E a contradição que Marx vislumbrava era justamente
a revolta gerada a partir da tomada de consciência desta condição existencial
na qual se encontravam, e ainda se encontram, vastas populações.