quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Eu sou latino-tupiniquim



A realidade brasileira está emporcalhada.
Temos o melhor presidente de todos os tempos
E temos também a certeza de que nada mudou.

Nenhuma das principais peças do tabuleiro foi mexida.

"O Cara" veio do povo, articulou a força por baixo,
Sofreu o martírio da pobreza seca e rachada,
Representou seus semelhantes,
Foi o objeto das maiores expectativas,
Tornou-se, irrefutavelmente, o emblema de seu partido,
Obteu os melhores índices estatísticos,
Os mais refinados elogios,
Prêmios variados e variáveis,
Refundou a política brasileira,

E meu país, amigo, continua uma merda.

Eu me lembro, mesmo sem ter visto,
Que faz mais de quinhentos anos
Que um grupinho desgraçado
Suga as riquezas naturais,
Esfola os humanos sociais,
Aniquila todo potencial criativo existente
Desmanchando a moral e a consciência,
Usurpando, parasitando, cagando em tudo!

E rindo a risada gorda e cômoda daquele que ocupa a poltrona da hipocrisia.

Nem "O Cara" conseguiu fazer alguma coisa...
Na verdade, "O Cara" fez o jogo dos caras...
E agora, o que nos restou?
No que vamos acreditar?

No movimento, na militância, nesse esforço coletivo,
Na ciência, no trabalho do partido,
Em alguma religião, alguma organização política,
Numa instituição talvez, um ordenamento normativo,
Numa carta política, numa relação de produção,
Num método pra interpretar a realidade e tentar transformá-la,
Nas drogas, no sexo, em video-game, no bacon com catupiry,
Nas banalidades e superficialidades,
Na morte, em Jesus, em Buda, Gandhi,
Chico Xavier, Copa do Mundo, Galvão Bueno,
No Amor, na piedade, na moral, na educação, na pedagogia,
Na conscientização política pelo esporte,
No trabalho de base, na caridade, na sociedade,
No bom selvagem, em Deus, no Caos,

Depois de tudo que aconteceu e ainda acontece, no que podemos acreditar?!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Uma carta de amor




Uma carta de amor, com amor, para um amor...



Algumas pessoas se vão e, contrariando as regras do jogo humano, adquirem mais importância ainda. É que a distância é relativa. Algumas pessoas estão fisicamente distantes, mas mesmo assim compreendemos a evidência: é na distância que a importância de alguém se revela. Quanto mais longe, mais sensíveis ficamos, e assim sentimos qual peça essencial do nosso tabuleiro aquela pessoa conseguiu mexer. E algumas vezes, certas pessoas abalam o nosso edifício inteiro.

A vida, com sua luta e seu sofrimento, às vezes nos enrijece, nos enrijece demais, fazendo-nos esquecer que certas histórias não são apenas ficção literária. É que o real supera a ficção. Por isso que aqui e ali existem essas histórias sobre relações e relacionamentos humanos tão fortes que conseguiram se manter e se desenvolver nas piores adversidades. O humano, em conjunto, se reinventa. O nazista e a judia se amarão, tal qual o escravo e a senhora.

O tempo, assim como a distância, também não deixa de ser uma invenção humana. O que há de divino nessa idéia é que não pertencemos especificamente a algum lugar, a algum tempo, a alguma pessoa, ou a alguma idéia. Estamos volúveis, voláteis e então suscetíveis. Assim a liberdade se funda: na perda, na forma positiva de enxergarmos a perda. Porque nada se perde ou se acrescenta, mas apenas se transforma. Neste longo processo, fica a chance pra quem, rompendo com todas as naturais e ilógicas circunstâncias, decide amar. E ama, segue amando, o que quer que aconteça, onde quer que esteja, da forma como estiver.

Ser humano é ser diferente. Diferente porque eles conseguem amar algo que está contido em sua memória ou sua idéia. O humano tem a capacidade de amar sem estar em contato com o objeto amado. É que o contato também é relativo, e vez ou outra acabamos tocando aquelas pessoas mais especiais, na ânsia de que também nos toquem com a sua lembrança. Eu tenho a certeza de que o ser humano, quando se lembra de outro alguém com amor, estabelece uma forma de contato que nem mesmo a sua espécie capta e percebe. Ambos se lembram e se degustam na lembrança. São comunicações sem mediações, sem pontes pra que consigamos entendê-las. Porque o importante é nos comunicarmos, sempre.

Veio você, e com uma naturalidade absurda, brincou com a minha estrutura. Me reordenou e me reinventou. Mexeu em duas peças, e tive que repensar como reordenar meu tabuleiro inteiro. Você tinha apenas algumas horas e um pequeno conjunto de palavras, e mesmo assim obteve o melhor aproveitamento nesta mágica do encanto. Do encanto dos encontros e desencontros. E a prova disso, de que o que hoje eu sou contém uma parte de você; que a sua forma de existir ajudou a preencher com conteúdo o pote da minha essência; que tudo é real e vivo hoje como foi ontem e como será amanhã; a prova disso é que hoje eu sou assim...