quinta-feira, 30 de abril de 2009

Segredo da concha

Uma poesia é verdadeiramente bela
Não por todas as coisas que disse,
Mas justamente por aquelas que, dizendo,
Acabou deixando de dizer.

Tem me faltado esse desabafo.
Tem me faltado a ausência alheia para o encontro consigo.
Tem me faltado essa solidão tão importante para que realmente sejamos.
Tem me faltado palavras para descrever coisas talvez inexprimíveis.
Tem me faltado a audácia para tentar descrevê-las.

E o que tem me sobrado é razão.

Tem me faltado a presença constante de pessoas as quais odeio.
Tem me faltado descrétido em relação a mim mesmo.

Sobra-me certezas.

Tem me faltado descontrole.
Tem me faltado lágrimas por motivos bestas.
Que chorar, essa ocasião tão especial, só faço se valer a pena.

Mas lágrima, que não poderia deixar de ser lágrima,
Só é realmente para ocasiões que não as merecem,
Sob pena de só chorarmos para aquilo que aos nossos olhos vale a pena.
Se a gente chora, é justamente porque não mais vale a pena.
Valesse e cantaríamos.

Tem me faltado paciência.
Tem me faltado uma saúde plena.
Tem me faltado tantos esportes e tantos exercícios físicos.
Tem me faltado o prazer de estar só, de mim para consigo.

O que me sobra é coisa demais.
Tão mais que transborda,
E a cada transbordada,
Vem a pobre razão achar que pra tudo há ciência.

Se eu realmente tivesse certeza de alguma coisa,
Escreveria para que ninguém lesse.
Afinal, se escrevo e leio, é porque tenho a fé de que a verdade nunca chegará.
Chegasse e se acabaria o mundo.

Isso é o que tem me faltado:
A inexplicável coceira que sofre a curiosidade
Quando o sentimento se resume ao mistério.
Sentir o mistério.
Ser o mistério.
Querer o mistério.
Porque o mistério é sim verdadeiro.

Tem me faltado mistério.
Tem me sobrado palavras ordenadas em versos.

Caos é a única coisa que realmente está infincada
Nos cérebros e corações da humanidade, apenas pela força do hábito.
Não fosse o caos, não tentaríamos nos ordenar.
Fosse uma ordem singelamente e timidamente imposta,
Para vir um louco suficientemente audaz
E desafiá-la toda.

Arrepio do lado esquerdo.
E mistério nas juntas.
Tem me faltado a dúvida de ser o que sou.
Me sobrado o achismo de o saber.
Não fossem os saberes meros achares,
Erros não haveriam para que nos construíssemos.

A vida se faz com erros.
Só a ciência consegue ser feita com acertos.
O importante é o mistério,
Guardado em cada olhar transeunte da existência,
Viagem de ida, ferida composta.
Fosse uma única dor
E já não saberíamos qual o prazer de viver.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Você se expressa em forma de eu, viu no que deu?






Talvez eu não queira vencer na vida. Talvez eu não deseje ter dentes suficientemente brancos Colgate®. Vitória e brancura não deixam de ser juízos de valor.

E se eu não quiser amar uma pessoa pra sempre. E se eu decidir, por escolha – não por fuga, ou por medo, ou pela fuga que vem do medo – não acreditar no amor. E se minhas condições não forem perguntas, mas imposições afirmativas. E se esta frase, como todas as anteriores, não precisarem de ponto de interrogação.

Será que todas as obras de arte do mundo, distintas todas que sejam, não deixam todas de serem diários? É possível dissociar a arte de seu próprio artista? Um escritor, ou um pintor, ou até um músico, em algum momento, único que seja, não fará uma carta-colorida-e-musicada sobre suas mágoas incuráveis, suas bestas esperanças, suas bestas escondidas? E então, a emoção que a arte causa, em quem a cria, em quem a absorve, ponte de ligação, pleonasmo redundante, não é uma imitação do idêntico?

Pois eu duvido que não sintamos a mesma sensação. Sexo, Maconha, Samba com Feijoada, Picasso, Fernando Pessoa, Açaí, Massagem nos Pés, Futebolzinho de Noite encantam tantas pessoas porque causam inúmeras, inigualáveis-incontáveisinfinitas sensações ou simplesmente porque ativam justamente a mesma descarga hormonal em todos nós, os caras que acharam que eram o rei de tudo, teorema da complexidade, razão divina, construção, paz-amor-e-bala, metáfora, conhecimento, rei do próprio umbigo de olho no do outro.

Vai vendo hein cara, os dinossauros se foderam.

Mano, como eu vou dissociar o que eu escrevo do que eu sou? Eu tenho certeza que o Machado de Assis já comeu uma Capitu, que claaaaro, não se chamava Capitu, olhos-de-ressaca-sugestão, loira ou assim ou assado ou segredo, nem vou te contá-ar! É óbvio que o Johnn Lennon andou usando algumas drogas pesadas, não precisa o jornal doninho-da-verdade-que-ele-mesmo-criou vir me falar disso. Eu escuto o som, eu vivo o som, eu conheço pessoas que curtem o som, eu analiso essas pessoas, eu me analiso em convívio com elas, eu sei que drogas elas usam, eu sei quais os efeitos instantâneos e os colaterais, já escutei depoimentos, além de ter prazer na música, ter um ouvido atencioso, uma preferência refinada sem ser preconceituosa, uma noção vai... Eu sei o que tá rolando com a arte dos outros. E assim, com eles.

Será mesmo que o escritor que não consegue transcender seus paradigmas cai no sempre-mesmo, o erro-retornado? Será mesmo que eu, na minha condição de agente por trás da linguagem, que neste exato momento a instrumentaliza, mas ao mesmo tempo é por ela instrumentalizado, consigo construir uma arte dissociada do meu eu sem cair no controle total da linguagem que me instrumentaliza e me controla, e acha que me faz escrever o que ela quer, o que ela quer, ela quer, ela quer, quer, quer, quer?
Que puta dilema moral, mano!

O mais legal é incomodar quem fala certinho juntando gírias renegadas com palavras que causam impacto técnico, científico ou significativo.

Eu falar do jeito que eu quero não é ser ignorante, dá licença?

Eu também conheço o Ego-Superego-Id, eu sei fazer análise técnica em gráficos da Bolsa pra descobrir tendências, sim, eu cozinho muito bem, já li Dostoievski e Weber, já fui em umas quarenta e nove exposições no Masp, já peguei uma moça que era modelo e me entediei, sei dançar forró, sei o que significa Common Law, guardo dinheiro na poupança, e só porque eu falo “véio, cê ta tirano-né?” você é melhor que eu?

Vai se foder. Não sabe qual é a metade da caminhada.

Eu gosto de estar aqui quando comigo. Será mesmo que a arte é uma ponte de ligação de si para consigo mesmo, será a arte o único ente suficientemente e factivelmente democrático, posto que gera prazer sem cobrar, único jogo social humanóide que não tem como causa e conseqüência estabelecer-se uma relação de poder, onde um exerça domínio e outro padeça dormino?

DorminDooooooooooooooo! Eeeeeeeeeeerrrrrrrrrr...

Na terceira-série (digressão: porra, quase escrevi terçeira, irmão! Acho que é por causa de terça-feira, terceira, puta odeio que o Word tira o cedilha “errado” QUE EU QUERO COLOCAR!, terçeira), esse seria um comentário que causaria um sofrimento mórbido, as crianças, por ausência de personalidade já concretizada, cedem muito perante uma moral estabelecida pela maioria, ou mais admirados (admirados pela qualidade-defeito que você desejar, essa é a pira dos grupos sociais infantis) da turma.

Bom, e daí? Foda-se.

É que é engraçado, falam que a infância é a melhor idade, mas é mentira, é uma bosta, eu não transei quando era criança, eu não usei entorpecentes, eu não andei de montanha-russa, eu não senti a adrenalida de trocar socos com alguém enormemente maior, não senti a decepção de um amor que gera o maior tipo de calo que pode existir, calo na fé. Não conheci lugares lindos, pessoas maravilhosas e nem ficava maravilhado com expressões artísticas e avanços científicos. Não tinha dinheiro e quando tinha, não sabia controlá-lo.

Meu cérebro cria quando eu escuto um som do Mozart, do Chico Buarque. Não é que ele crie por inspiração, crie imitação de “Construção”. Ele cria porque inova, porque cada acorde me gera um arrepio-diferente, sensação-que-não-tem-nome, cutuco-delicado, carinho-arranhado. E sim, aqui houve criação! A arte cria até quando é absorvida. Por isso foi e sempre continuará sendo a maior forma de sedução de um ser humano para com outro, para com outros, de um ser humano para com todos, de todos os seres humanos para com um, mas principalmente, de um ser humano para consigo.

Nossa, que gênio hein, dá uma esporrada no monitor agora. Bate uma punheta com sete fotos 3x4 suas, espalhadas pela escrivaninha.

Que monólogo masturbativo.

E aí, o escritor tem controle no texto ou ele é autônomo?

O texto é inicialmente O escritor e depois ganha capacidade-significativa própria?

Própria ou dada por quem o lê?

E será que um texto tem capacidade significativa sem ninguém tê-lo lido?!

Puts, claro, os regimes totalitários, cara!

Aeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!

...

Game Over.

- Pedrinho-amor, você tá bem?
- Só escrevendo um pouco, Raquel...
- Falando sozinho?
- Com o monitor.
- Ah...
- Só lexotan...
- Tô vendo.