
A primeira coisa sobre a qual refleti hoje ao acordar foi minha postura diante dos últimos acontecimentos. Mais que isso, nos efeitos que o meu procedimento despendeu no mundo, nas pessoas, no sentimento dessas pessoas. Lembrei-me quando Sartre diz, no Existencialismo é um Humanismo, que os sentimentos também são definidos por ações.
Ora, só há como identificarmos um sentimento por alguém a partir do momento que certas atitudes, posturas e escolhas são exercidas de maneira concreta. Os sentimentos, mesmo para quem os sente, não podem ser definidos a priori. Não podemos identificar a pulsão que nos impele a se mover e a agir sem antes nos mover, sem antes agir. A ação, o gesto, os movimentos corporais são justamente a única catarse que o sentimento encontra para irromper no mundo.
Não posso consultar a minha memória, que registrou todas minhas impressões sensoriais, para decidir sobre qual caminho vou percorrer. Percorrendo é que me descubro. Na auto-descoberta é que me percebo amando. Em outras palavras, se sinto uma forma de anseio que viso realizar, mas uma pessoa que me é afeta não concorda com aquilo, o único caminho para que se descubra qual dos dois vou escolher somente pode ser a própria escolha. Por mais que eu já tenha experimentado o sabor e o dissabor que os acontecimentos da vida me causam - isto é, a realização daquele desejo, a presença daquela pessoa - nunca poderei ter por revelado qual deles prefiro antes da própria escolha. Não posso me perguntar “de qual gosto mais” para saber como proceder. É procedendo que descobrirei de qual eu estou gostando mais no presente momento.
É nossa escolha, de maneira essencial, que faz o mundo irromper dentro de nós, debater-se dentro de nós. Na mesma medida, só mesmo a escolha viabiliza o processo no qual o outro vai me captar, me entender, me compreender, me sentir. A ação da escolha faz o mundo irromper em mim e, neste processo, irrompo no mundo. É no olhar e na palavra que descubro o mundo e que me revelo para ele; nunca em exercícios de introspecção consultiva.
Talvez seja isto o que Sartre sentia por existencialismo. Viver sob o leque infinito e transbordante do gesto, das possibilidades que a ação pode viabilizar ou, até mesmo, gerar. A ação é tão fabulosa que é capaz de criar artifícios e seduções de acaso que, no mais das vezes, servem de instrumento para que a dominação seja exercida de forma afetuosa, aceitável, legítima.
Um comentário:
Os sentidos físicos são simplesmente a manipulação externa e grosseira, o prolongamento na superfície do ser, dos sentidos íntimos e ocultos. Senão um cego, surdo e mudo não conseguiria manifestar seus sentimentos por ter suas ações limitadas.
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